quinta-feira, 19 de março de 2009

A entrevista e seus modos de entrevistar


Por Carlos Inácio

Queremos aproveitar o ensejo de publicar em nosso blog uma série de entrevistas com artistas de várias tendências para fazer algumas considerações acerca do que tem sido o ato de entrevistar, ao menos em nosso país, nas grandes instituições de comunicação brasileira, em particular nas emissoras de televisão. A idéia surgiu enquanto assistia uma entrevista do diretor alemão Rainer Werner Fassbinder, que fazia parte do Bônus do seu filme Lili Marlene. Aliás, a entrevista era justamente acerca do lançamento deste mesmo filme se não me engano no ano de 1978.
Assistindo a entrevista acabei me sentindo intimidado pelo modo como a apresentadora formulava as perguntas e mais ainda pelo modo como Fassbinder as recebia e as respondia sem o menor problema. A entrevistadora elaborava suas perguntas colocando o diretor alemão contra a parede, as elaborava a partir do que o diretor respondia naquele momento e não seguindo uma receita de perguntas elaboras previamente. Uma entrevista dinâmica como nunca havia visto antes, em que havia o interesse sincero de explorar todas as possibilidades estéticas tanto da obra, no caso o filme Lili Marlene, quanto das idéias do próprio Fassbinder. Ali aconteceu um debate sincero, sem demagogias e quem assistiu ou assistir essa entrevista realmente saíra com algo na cuca acerca do que foi dito. Não houve promoção do filme, muito menos do diretor. A entrevistadora tinha uma perspectiva própria do que seja o fazer cinema, do que seja arte, que em muitos pontos divergia daquelas do entrevistado. O melhor é que ela se expressava de igual para igual com o Fassbinder.
Terminada a entrevista e deixado o transe de espectador foi que percebi ter sentido aquela sensação de constrangimento acerca do modo como a entrevista foi conduzida. O pior foi ter chegado à conclusão de que só tive tal sensação por estar enquadrado dentro de um formato de entrevista inerente às grandes instituições de massa, que não fazem mais do que apresentar artistas, sejam eles de quaisquer vertentes artísticas, como produtos prontos para o consumo. Essa espécie de entrevista geralmente são feitas em programas de auditório, como Faustão, Hebe e o caralho à quatro e parecem mais um formulário do IBGE. Esses programas não passam de vitrine, uma bolsa de valores do mercado cultural. Fica mais feio esse procedimento em programas como Jô Soares e Altas Horas, que posam de cult, pois recebem artistas cujo trabalho são de grande relevância para a produção artística e intelectual do Brasilde e que no entanto sò reproduzem uma ladainha insossa. O espectador e o artista convidado acabam sendo obrigados a ouvir essa conversa fiada, piadas de papagaio e a mesma pergunta que é dirigida indistintamente a todos os convidados sem levar em consideração suas particularidades artísticas. Claro que existem exceções como o programa Povocações do Antônio Abujamra e o Sem Frescura do Paulo Cezar Peréio, o Ensaio claro, o Conexão Roberto Dávilla ok. Existem estes programas, mas eles orbitam em um espaço quase subterrâneo, pois passam em horários estranhos, que não são fixos e em emissoras cujo sinal só é alcançado por uma antena parabólica ou uma assinatura da Sky.
Podemos tirar de tudo isso que a condução da entrevista deve ser inquiridora, no sentido de trazer à tona o sumo do artista, ou seja, suas idéias mais suculentas aquelas que só podem ser alcançadas por perguntas fortes livres de compromissos comerciais. Tentaremos seguir essa vertente em nossa série de entrevistas, esperamos seguir por caminhos interessantes. É importante a postagem de críticas a respeito das entrevistas publicadas para que possamos melhorar o procedimento de inquirição na entrevista seguinte.

2 comentários:

  1. Meu amigo, antes de mais nada, tamanha qualidade em seu blog, deve ser divulgado o máximo possível. É preciso um blog com esta vertente, artística e jornalística, assim como já falado, os programas Provocações e Conexão Roberto D'avilla.

    Seja bem vindo ao mundo dos blogueiros (que coisa brega). Hehe

    Abraços

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  2. Então inseto, parece está rolando uma sintonia nova, eu aqui estava pensando nesta questão de como entrevistar as figuras diante de uma proposta nova... E a minha piração veio da entrevista recente que vi do godard entrevistando o Fritz Lang, que se converte numa grande exposição a dois do cinema e não em considerações pré-prontas sobre o mesmo... O nome da entrevista é o Dinossauro e o Bebé, simplesmente genial... Tô pensando em três nomes pra começarmos essa serie!

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