quinta-feira, 2 de abril de 2009

Coisa material também é gente


Recentemente tive que me desfazer de alguns objetos pelos quais nutria um carinho imenso. Tais objetos estavam comigo há muitos anos e não pude deixar de me livrar deles com um aperto muito grande no coração. Geralmente o tempo de uso desse tipo de objeto é muito curto e as pessoas os descartam sem qualquer dor na consciência. Porém pra mim coisa material também é gente. Havia algumas camisas e bermudas que estavam comigo desde quando vim para salvador em 2000 e agora em 2008 fui obrigado a me desfazer delas. Outros objetos em sua maioria cadernos e folhas de papel tiveram o mesmo destino.
Partiu de pessoas queridas a sugestão de jogar fora esses objetos com os quais dividia uma história, com os quais passei situações muito desagradáveis e outras muito boas, que marcaram minha vida. Entendo a situação e a conclusão a qual tais pessoas chegaram, racionalmente era o que devia ser feito, uma vez que estávamos de mudança e necessitávamos de espaço para acomodar nossas coisas.
Minha intenção na verdade era guardar esses objetos, pois eles representam o resgate de minhas vivências, são memórias sensíveis que magicamente faziam brotar aqueles momentos que vivi, nos quais vestia aquela bermuda ou aquela camisa ou aquela bota, lia ou escrevia aqueles papéis! Para isso bastava vê-las, tocá-las e voltar no tempo e me ver beijando Elidi pela primeira vez, me ver caindo no esgoto do canal da Barra com M., os sentimentos que tinha aos dezenove anos quando escrevi aquelas frases, quando fui à casa de Danilo pela primeira vez, quando Gil e eu falamos do Mundo Desabitado pela primeira vez e por ai vai.
Consegui preservar algumas coisas realmente muito importantes pra mim, como por exemplo, minha camisa do Iron Maiden que comprei em 1994 quando tinha catorze anos e a minha bermuda azul que eu adoro e com a qual fui à praia com a galera da faculdade e tinha que amarrá-la com um arame de varal na minha cintura porque não tinha um cinto. Não pude ser o Shindler de outras coisas como gostaria e minha bermuda preta com uma manchinha branca na perna direita foi pro lixo. Ao menos alguma coisa ficou.
Além das minhas queridas roupas tive que me livrar de vários outros pertences como os cadernos que trouxe de Minas onde arriscava escrever alguns poemas, uma série de panfletos recolhidos na saída de shows ou cinemas e que me remetiam àquele momento em que curtia o show ou assistia ao filme sempre que os tinha sobre meu olhar. O argumento principal usado como motivo para que me desfizesse de tais objetos foi que eram velharia e não tinham mais nenhuma utilidade: os cadernos já estavam escritos, os shows já tinham acontecido, os livros já haviam sido lidos, as roupas já haviam sido vestidas demais, etc. Se é assim qual o sentido de preservar essas coisas? Se pensarmos utilitariamente não há motivo algum. Porém se pensarmos em termos afetivos os motivos são muitos. Quando estiveram envolvidos em momentos marcantes da minha vida tais objetos passaram a ser mais que simples objetos, mas emoções, sentimentos, como disse, lembranças sensíveis, verdadeiros amigos, que enquanto estivessem preservados haveria sempre a possibilidade de ativarem minha memória e me permitir desfrutar daqueles momentos vividos. Ao descartá-las talvez tenha perdido para sempre as lembranças que esses objetos tão queridos guardavam consigo.

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